Um dos eventos decisivos da história do Whole Foods aconteceu há mais de 30 anos, no Memorial Day de 1981, quando existia apenas uma loja.
Estávamos em funcionamento com o novo formato e sob nova marca havia apenas 8 meses. Nossa loja rapidamente tornou-se um grande sucesso. Os clientes admiravam fazer compras lá e os colaboradores gostavam de trabalhar e acreditavam no que estávamos fazendo, ao mesmo tempo que tinham uma grande dose de liberdade para expressar sua individualidade. Os colegas de equipe se gostavam e atendiam bem os clientes. Naquele dia, porém, a cidade de Austin sofreu a pior inundação em 70 anos. Treze pessoas morreram e a catástrofe deixou mais de US$ 35 milhões de danos (o equivalente hoje a cerca de US$ 100 milhões). A água subiu 2,4 metros dentro da nossa loja. Perdemos o estoque inteiro e todos os equipamentos, em um prejuízo que chegou a cerca de US$ 400 mil. A inundação levou praticamente tudo o que tínhamos. Não possuíamos reservas de dinheiro, seguros ou estoques guardados em outro lugar. Sem maneira de nos reerguer com os próprios recursos, estávamos falidos.
No dia seguinte à enchente, quando nós, fundadores e integrantes da equipe, vimos o estrago, muitos ficaram com os olhos marejados. Para os colaboradores, parecia o fim do melhor emprego que já tiveram, enquanto os fundadores se viam diante do término de um sonho maravilhoso, mas que infelizmente durara pouco. Enquanto tentávamos desoladamente salvar o que fosse possível, algo inesperado aconteceu: dezenas de clientes e vizinhos apareceram na loja. Como era feriado, muitos estavam de folga e vieram com roupas de trabalho, trazendo baldes, esfregões e tudo o mais que julgassem útil. Eles chegavam animados: “Vamos lá pessoal. Mãos à obra. Vamos arrumar tudo e deixar isso aqui perfeito. Não vamos deixar a loja morrer. Chega de lamentação e vamos trabalhar!”.
Você pode imaginar o efeito que essa iniciativa exerceu sobre nós. De repente, encontramos novas energias e sentimos um lampejo de esperança de que talvez nem tudo estivesse perdido. Mas não foi só isso: nas semanas seguintes, dezenas e dezenas de clientes continuaram vindo para ajudar a limpar e consertar a loja. Quando perguntamos por que faziam isso aquilo, eles respondiam coisas como “O Whole Foods é muito importante para mim. Não tenho certeza se ia querer viver em Austin se não fosse essa loja ou se ela desaparecesse. Ela fez uma diferença enorme em minha vida”. É difícil estimar o impacto de tudo isso, pois nos sentimos tão queridos por nossos clientes que decidimos começar de novo. Pensamos: “Esses clientes nos amam tanto e nos ajudaram com tanta dedicação que temos o dever de fazer o possível para reabrir e atendê-los da melhor forma possível”.
Não foram apenas nossos clientes que nos ajudaram. Houve uma avalanche de apoio de outros integrantes da comunidade, que se prontificaram a nos socorrer. A empresa faliu com a enchente, e não tínhamos como pagar as pessoas. Muitos dos nossos colaboradores, então, trabalharam sem receber. É claro que acertamos tudo quando a atividade recomeçou, mas não tínhamos como garantir que a retomada daria certo. Dezenas de fornecedores se ofereceram para nos reabastecer com base no crédito, porque queriam que a loja voltasse a funcionar e apostavam que conseguiríamos pagar as contas. Tudo isso criou um compromisso de lealdade entre a empresa e os fornecedores, e alguns deles ainda trabalham conosco depois de mais de três décadas. Nossos investidores acreditavam no Whole Foods e colocaram a
mão no bolso para fazer novos aportes. O banco concedeu um empréstimo que nos permitiu reabastecer a loja. Na verdade, todos os principais stakeholders (clientes, colaboradores, fornecedores e investidores) se manifestaram após a tragédia, para se certificar de que o Whole Foods Market não morreria e que seríamos capazes de reabrir. E foi o que fizemos, 28 dias depois da inundação.
A experiência com a enchente do Memorial Day de 1981 unificou nossa jovem empresa. O fato nos mostrou que todos os nossos stakeholders tinham potencial para estabelecer uma relação estreita conosco, envolvendo cuidado e compromisso. Nossa equipe se aproximou e nosso compromisso com os clientes ganhou profundidade. Percebemos que estávamos realmente fazendo diferença na vida das pessoas.
Hoje, parece até humilhante pensar no que teria acontecido se todos os stakeholders não se importassem conosco naquela época. Sem dúvida, o Whole Foods Market teria deixado de existir. A empresa, atualmente com vendas anuais de mais de US$ 11 bilhões, teria desaparecido no primeiro ano de vida se as partes interessadas não estivessem envolvidas e preocupadas, se não aprovassem o tipo de negócio que oferecíamos. Quantas empresas “convencionais” conseguiriam reunir um exército voluntário de clientes e fornecedores para ajudar na hora da necessidade? Essa é uma das razões pelas quais entendemos tão bem a importância dos stakeholders e o poder do amor nos negócios, pois tivemos a chance de testemunhar sua contribuição para o nosso sucesso. Sem isso, não teríamos sequer sobrevivido. Nunca mais precisei de provas adicionais de que as partes interessadas fazem a diferença, de que encarnam o coração, a alma e a força vital de uma empresa.